quinta-feira, 9 de julho de 2009

A ética da alteridade

“Porque, se só amardes os que vos amam, qual será a vossa recompensa? Não procedem assim também os publicanos? Se apenas os vossos irmãos saudardes, que é o que com isso fazeis mais do que do que os outros? Não fazem outro tanto os pagãos?”
(S.Mateus, cap.V, vv.46 e 47.)


A escola dos relacionamentos é o convite da vida para a vitória sobre o egoísmo. Viver é de todos, conviver é de poucos, e conviver bem é para quantos disponham encetar nova jornada ante a nossa condição de “cidadãos do universo.”
Cada pessoa que passa pela nossa vida, ainda que superficial e circunstancialmente, é portadora de uma mensagem de vida para nós. Não existem relações casuais.
A boa convivência é quesito de qualidade de vida. Quem a experimenta sorri mais, tem melhor tônus muscular, forra-se do cansaço dos agastamentos, logra melhor nível de sono, vence facilmente a rotina, imuniza-se contra o tédio, amplia sua criatividade e viver na atmosfera da paz.
Livros desatualizam, eventos fecham ciclos, instituições extinguem-se e as tarefas são recursos didáticos, mas os relacionamentos perpetuam na consciência, são as únicas realidades plausíveis de todo o cosmo doutrinário, é a essência do Espiritismo em nós.
Por isso, temos que aprofundar conceitos em torno da alteridade no melhor encaminhamento das nossas questões de amor ao próximo, seja nas atividades educativas da doutrina, seja nas forjas disciplinadoras da sociedade.
Concebamos a alteridade, sem rigor técnico, como sendo a singularidade pertinente a cada criatura. Naturalmente, o conjunto das singularidades humanas estabelece a diversidade. Essa diversidade nos solicita, perante os sábios Códigos do Criador, uma ética nas relações que reflita os princípios de pluralidade natural para a harmonia e evolução.
Assinalemos, assim, de forma compreensível, que a “ética da alteridade” é a nossa capacidade de relativizarmo-nos perante as diferenças das quais os outros são portadores, convivendo em paz com nossos diferentes e suas diferenças, rendendo-lhes respeito e amor na forma como são e se expressam, nas suas particularidades.
Reconhecemos a melhoria das nossas condições pessoais através desse preito espontâneo de reverência, a quem quer que seja, sem que tenhamos que perder a identidade íntima, mantendo-a sempre resguardada pela definição de propósitos e coerência como características de criaturas espiritualmente saudáveis. Ética de alteridade não significa concordar com tudo ou aprovar tudo, ela não nos retira o senso de valor moral enobrecedor, pois nem toda alteridade está engajada nas sendas do bem. Por exemplo: algumas comunidades aferradas ao folclore manterão rituais ou festas que, para o progresso social, em nada cooperam objetivamente, trazendo algum benefício somente para aqueles que fazem cultos a lendas e tradições. Nosso “dever alteritário”, contudo, é respeitar a diferença, buscar aprender algo sobre a “essência do outro” – uma razão profunda e Divina para aquele comportamento, algo “invisível aos olhos” como acentua o inspirado Antoine de Saint Exupéry.
Portanto, perante diferenças sociais, corporais, intelectuais ou de que natureza for, adotemos a ética da alteridade e vivamos em paz.
Muitas pessoas nutrem um terrível vazio existencial porque querem existir mudando o outro, querem se realizar no outro, acham que têm as respostas para ele, querem “anular a diferença” alheia para se sentirem bem.
Por isso é tão comum encontrarmos deficiências no próximo. Sempre achamos que se ele mudasse nisso ou naquilo tudo seria melhor e ele, inclusive, seria mais feliz. Esse é o velho hábito da intromissão perniciosa nas desconhecidas terras do mundo da diversidade, que queremos moldar a gosto pessoal, talhando a igualdade importuna ou contraria os interesses. Muitos conflitos nascem exatamente nesse ato de apropriação indevida da conduta e da forma de ser do próximo. Não sabendo considerar-lhe a singularidade, tentamos combater a diferença ou, o que é pior, adotamos a indiferença...
Pensemos urgentemente na construção da conduta de alteridade em nossas relações.
Prezemos as diferenças e honremo-las com a ética da fraternidade, esse o roteiro saudável proposto por Jesus em Sua sábia interrogação: Porque, se só amardes os que vos amam, qual será a vossa recompensa?



Do livro Unidos pelo Amor – Ética e Cidadania à Luz dos Fundamentos Espíritas
Psicografia de Wanderley S. de Oliveira
Espíritos: Ermance Dufaux e Cícero Pereira

4 comentários:

  1. É com refletirmos sobre a nossa habilidade e desafio em saber se relacionar com o semelhante. E falando em semelhante, cadê os irmãos espíritas da Casa da Caridade? Por que não entram no blog e postam seus comentários? Vamos participar gente!

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  2. Fernando Antonio de Barros Lins10 de julho de 2009 às 11:28

    Não adianta querermos mudar a postura das pessoas, porque cada ente humano tem o seu grau subjetivo - a sua própria percepção de vida, necessário é que respeitemos as diferenças existentes em todos nós e,é a partir das diferenças respeitadas que conseguiremos, passo a passo, desenvolver, não somente no grupo societário, mas principalmente em cada um de nós uma postura de eficiente crescimento interno e espiritual.

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  3. "Nosso limite termina quando começa o do outro¨". Por isso, devemos respeitar a individualidade do outro e aceitar as pessoas como elas são.Porém, sem jamais deixarmos de perder nossa identidade.

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