quinta-feira, 12 de novembro de 2009

A redimida de Magdala

Magdala era um burgo pertencente à Galiléia, um dos mais desprestigiados pela política da época, por não favorecer ricos recursos aos mandatários estrangeiros e aos sacerdotes. Mas tinha fama, que correia por toda a Palestina, pela beleza de suas mulheres. Entre elas havia uma em especial. Maria de Magdala. Uma das mais belas mulheres, que encantava os homens e espalhava a inveja entre o público feminino. A pequena localidade era buscada apenas pelos patrícios romanos para os prazeres da carne, que exploravam as pobres mulheres, que se entregam em troca de tecido, vinho e comida.

Maria, em parte forçada pelas circunstâncias da vida a viver como prostituta, atraiu para si sete espíritos, que igualmente saciavam por meio dela os inconfessáveis desejos. Em Lucas, capítulo 8, versículo 2, está descrito que ela era atormenta por sete espíritos, daí a teoria dos sete pecados capitais.

As mais altas patentes romanas encontravam-se com Maria em sua luxuosa casa e protegiam a atormenta mulher dos apedrejamentos, comuns para mulheres adúlteras e prostitutas. Porém, temendo conseqüências, alguns Sacerdotes e políticos romanos preferiam tolerá-la e usá-la.

Mas, Maria era uma alma de grande sensibilidade. Apesar de não cobrar pelos seus serviços, sempre recebia grandes agrados dos homens que a procuravam. Com o que arrecadava, ajudava muitos pobres e outras mulheres que eram exploradas.

Maria, no entanto, era muito infeliz. A sua aparente alegria não conseguia apagar o vazio de seu coração. Não queria ser o que era, mas não tinha forças suficientes para superar a si mesma.

Um dia, quando estava como que entorpecida, mergulhada em um grande vazio moral e atormenta pelos espíritos obsessores, um homem muito simples, um desses pedintes que ela havia ajudado, a procura. Bate a porta e o mordomo vem recebê-lo. “Preciso falar com patroa”, diz o homem. Mas o mordomo o afasta zombando da condição. Numa distração do Mordomo, o pedinte entra na bela casa, percorre os cômodos e chega até seus aposentos, onde Maria estava adormecida, mas não em sono profundo.

“Senhora”, diz ele. “Preciso falar-lhe de um homem bom. Um homem que cura a ferida do corpo e da alma. Um homem que ama os pecadores, que anda com os pobres, que ergue os caídos, que faz cego enxergar e que expulsa demônios.. Hoje ele estará pregando na casa de Simão, o Fariseu”

Maria, porém, não consegue identificar claramente o que ele diz, envolta pelas energias dos espíritos que a vampirizavam. Sacode a cabeça, afasta-se do pobre homem e diz que não tem esperanças. “Não há salvação para uma pecadora. Não posso ser curada por ninguém”. E volta a cair num torpor incontrolável.

O Mordono descobre o coitado e o despede com grosseria. “Não atrapalhe o descanso de minha senhora, seu miserável”. O homem sai e toma o caminho dos peregrinos de Jesus.

Em seus aposentos, a bela senhora dormia presa em pesadelos terríveis. Sonhos confusos e uma sensação de desespero a toma. Ela acorda, relembra, pelos caminhos do inconsciente, do que aquele homem havia falado.

Em dúvida e atormentada, acredita que tirar a própria vida era um caminho razoável. Mas, algo mais forte que ela, mais forte que eles, a domina. Levante-se e veste-se. Cobre-se para não ser reconhecida e sai pela noite escondida dos servos. Percorre caminhos escuros e chega a uma festa.

É a Casa de Simão, o Fariseu. Ele era acostumado a dar grandes recepções e havia convidado Jesus para visitá-lo. O Mestre sempre aproveitou as oportunidades para falar da Boa Nova.

Quando estava chegando ao fim o jantar, ouve-se uma grande confusão. De repente entra Maria de Magdala na sala. Nenhuma mulher poderia entrar, pois era uma reunião para homens.

Com o olhar aturdido, procura Jesus. “Onde está o Mestre?” Alguns saem de sua frente e ela o contempla. Caminha apressadamente e joga-se aos seus pés. Em prantos, mentalmente conversa com Ele: “Raboni, perdoa-me”

Jesus, com olhar meigo e sereno, mantém conversação com a mulher atormentada. “Maria, há quanto tempo eu te aguardo!” Ela suplica: “Mestre, ajuda-me, como posso pagar meus pecados? E Jesus responde suave: “Ama Maria. Ama os teus filhos”. Ela, confusa, continua: “Mas não tenho filhos. Sou oca por dentro”. Jesus, porém, fala de outros que não têm mães: “Ama os filhos que não têm mães, os filhos das mulheres que foram enganadas pelos homens”. Ama os filhos de Deus...”

Enquanto os olhares denunciavam uma conversação entre discípula e Mestre, Simão, o Fariseu, mentalmente diz: “Se ele fosse o Messias, saberia que esta mulher é uma pecadora e não a receberia”.

Jesus, percebendo o padrão vibratório de todos, especialmente dos fariseus, diz: “Simão, posso perguntar-se algo?” Ele, astutamente, responde: “Sim, senhor”. Jesus, então, conta um caso: “Há dois devedores: um devia 500 e outro 50 dináres. Como não tem com o que pagar, seu patrão os perdoa. Qual dos dois vai demonstrar mais amor pelo seu patrão?”

O fariseu, acostumado com os bens materiais da vida, hipócrita, afirma: “Aquele a quem mais se perdoou.” Jesus, responde: “Falas-te bem”. Mas o Cristo prossegue: “Vês esta mulher, Simão? Eu entrei em tua casa e você não lavou os meus pés. Ela banhou meus pés com suas lágrimas e enxugou com seus cabelos. Você não me deu o ósculo. Mas ela beijou-se os pés cansados. Ela, com muito amor, ainda perfumou-me com ungüento... Vá, minha filha, os teus pecados estão perdoados”

Apesar da revolta dos hipócritas, que não entenderam nada do que havia se passado, Maria se levanta e sai de cabeça erguida.

A redimida de Magdala retorna para seu lar e daquele dia em dia muda a sua vida. Ao amanhecer, começa a jogar pela janela todos os bens que havia conquistado. Jóias, roupas, móveis... Tudo estava dando a quem desejasse buscar. Nada mais lhe pertencia, a não ser o perdão e o amor insubstituíveis do Mestre.

Veste-se, simplesmente, e sai... É considera pelo mundo como louca... Havia se convertido ao Sublime Amor, que a todos resgata. Começa a seguir Jesus e a ouvir suas pregações. Come as sobras dos pães e cala-se diante das acusações dos seus algozes. É humilhada por todos, mas segue em oração, apesar do coração ferido.

É a única, junto com a mãe de Jesus e João Evangelista, a acompanhar o Mestre ao calvário, contemplando, em sofrimento, a lição valiosa que Jesus transmitia-nos. E mesmo quando diziam que ela era a prostituta de Magdala, a louca do burgo da Galiléia, selenciava e orava pelos seus algozes.

Vê, com os olhos cansados de chorar, o verdadeiro homem partir pelo ato enlouquecido dos homens. No terceiro dia, vai ao encontro do Mestre para fazer a limpeza do corpo, conforme mandava a tradição. Mas não o encontra. No caminho, é surpreendida pela visão sublime de Jesus. Recomece-o sob indescritível emoção.

Apressa-se e conta para os demais apóstolos. Uns permanecem em dúvida, outros a desdenham. Mas Maria, mãe de Jesus, a abraça e diz que o verdadeiro discípulo não duvida do amor de Jesus. “Quem crê, não sofre, confia em Jesus”

Após Jesus aparecer para os discípulos e ter ficado ainda entre eles por mais de 40 dias, Maria busca o apostolado. Mas os demais discípulos não a aceitam. Ser mulher e ter um passado tão difícil pesava muito perante as tradições machistas da sociedade.

Ele partiu sozinha pelo mundo e continuou a fazer pregações, a pedir esmolas, sobrevivendo da bondade dos outros.

Um dia, um grupo se aproxima. Passos lentos, odor terrível e um semblante de indizível sofrimentos. Eram leprosos. Homens, mulheres, crianças, velhos. “Aonde vades? Pergunta Maria. Um deles, com voz envolta em esperanças, responde: “Vamos ao encontro de Jesus. Soubemos que ele cura os leprosos e desejamos ser curados pelo amor do Messias”.

Maria chora e diz: “Jesus não está mais conosco. Mataram-no”. Os doentes olham entre si e uma sensação de profunda tristeza os invadiu. Toda a esperança da cura estava morta. Partiram, chorosos, para o vale dos leprosos, onde aguardariam o momento da morte.

Antes que eles se perdessem no horizonte, Maria ouve uma voz a dizer: “Ama Maria os teus filhos...” Ela, sem duvidar, os segue.

Por muitos anos prossegue ajudando aqueles que não têm o que comer, o que vestir. Doentes, cegos, paralíticos... A todos ajudava e pregava, falando de um homem verdadeiro, capaz de curar almas e não simplesmente corpos.

Todas as tarde, por volta das 17 horas, ela subia a um pequeno monte e falava de Jesus para os leprosos. Com uma voz suave, inicia a pregação dizendo, “Vós os leprosos...”

Um dia, porém, ao banhar-se, Maria sente uma ferida a altura dos seios. Naquela tarde, ao subir ao monte, olha para seus irmãos e diz mais feliz: “Nós, os leprosos...”

Os anos se passam, a bela mulher envelhece. Seu corpo escultural transforma-se num farrapo humano. Nada mais da bela dama de Magdala. O corpo estava morrendo...

Um dia, quando não mais agüentava as dores do corpo, ela deita-se e encosta a cabeça em uma pedra. Seus olhos, lentamente começavam a se fechar e ouve uma voz suave a dizer: “Venha comigo minha filha... Não temas, eu sou Jesus”

Maria é o maior exemplo que temos para falar da transformação íntima do ser. Um ser histórico que revolucionou a sua vida e venceu os maiores obsessores do espírito humano: o medo e a culpa.

O medo nos entorpece, nos anestesia, nos enfraquece... Por medo, durante anos, ela não conseguiu desvencilhar-se dos algozes físicos e espirituais. Tal como nós, que nos amedrontamos diantes dos desafios da vida, Maria temia perder o que havia conquistado, apesar de sentir o vazio em seu coração.

A culpa, tanto quanto o medo, é outro terrível algoz. A culpa nos adoece, nos envenena, calando os nossos esforços no recomeço. Maria sentia-se culpada pelos erros que cometera, pela infelicidade que havia levado a muitos lares, pela decepção e inveja das mulheres. A culpa entretecia seu olhar e a fazia arder de vergonha.

Como nós, Maria lutava para vencer o medo e a culpa. Esses fantasmas morais a iludiam, dando-lhe a mais terrível das perdas: a perda da esperança.

Porém, ele vence o medo e derrota a culpa. Ergue-se do lodo, semelhante ao lírio que nasce no pântano e perfuma os ambientes mais hostis. Ela se permitiu recomeçar, não se importando com o que os outros pensavam dela. Não mais temia os olhares acusadores ou as maledicências das pessoas. Seguia, caminhando em direção ao verdadeiro Amor, que a todos ergue e envolve.

É provável que o medo e a culpa ainda continuem os martirizando por muito tempo. Mas a intensidade e durabilidade da ação deles sobre nós dependem unicamente da nossa permissão. Temos a capacidade de escolher entre continuar no vazio da ilusão que o mundo proporciona, anestesiados pelos prazeres da vida temporal ou renascer, ressuscitar para o Cristo, ampliando nossa capacidade de amar, de perdoar, de ser feliz, tal como Maria de Magdala fez.


Fontes:
1. DVD Palestra Espírita de Divaldo Pereira Franco, Maria de Magdala;
2. Livro Jesus Voltando, João Nunes Maia, pelo espírito Shaolin;
3. Cap. 8, 2. Evangelho de Lucas.


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