quinta-feira, 10 de março de 2011

Último Capítulo - A árvore azul

Era época de natal, como eu disse. Tudo estava lindo para a chegada do dia do aniversário de Jesus. Todo ano, na noite em que o mundo comemora o nascimento do Cristo, as estrelas brilham mais fortes, o céu parece explodir de alegria, o vento é mais doce e gentil que habitual, as flores parecem obedecer a uma ordem superior e exalam perfumes encantadores. Os pássaros, ao entardecer, cantam e voam de um lado para outro, como que se apressassem para ficar tudo pronto para a grande festa. Eu, porém, continuava nostálgico.

E o grande dia chegou. Todos felizes, alguns mais que outros. Muitos, no entanto, repletos de saudades. Como eu, a maioria não havia recebido a visita de seus amados, estivessem eles encarnados ou domiciliados em outras paragens. Estávamos conformados, é bem verdade, mas ao mesmo tempo desejávamos muito voltar a ver os nossos afetos. Mas, nem tudo é possível, ao menos por algum tempo, também por aqui.

Como sempre, me dirigi ao auditório e como a noite era especial, recebemos a visita de um alto emissário de Jesus, que lindamente proferiu uma palestra sobre a lógica do amor à luz do advento do Cristo. Para ele, a humanidade compreendeu o amor de duas formas: uma antes e outra depois de Jesus. Na primeira, amar significava dominar, enquanto que na segunda, com a implantação do Evangelho no mundo, amar passou a significar doação incondicional.

Amar de forma incondicional, sem exigir nada pelo sentimento, nenhuma troca, dar sem receber, amar sem ser amado... Como seria possível? Como amar uma criatura, meu Deus, sem pedir a mesma dose de amor em troca? Eu mergulhava em dúvidas e me angustiava por não encontrar as respostas imediatamente. Como poderei amar o meu algoz, por exemplo? Isso parecia ser algo inadmissível para mim.

Depois da palestra nos confraternizamos, mas continuei me mantendo triste, pensativo, reflexivo. Sem que percebessem, sai do grupo de amigos e me dirigi ao jardim, um encanto de local. Sentei-me, observando o andar dos moradores da Colônia. O movimento era diferente, um pouco mais agitado que habitual, mas sem tumulto. Tudo muito tranqüilo.

O céu se mantinha estrelado, tendo a presença de uma lua encantadora, que não me deixava ficar sozinho, por mais solitário que eu pudesse me sentir. Meu olhar se perdia no infinito do céu, quando percebi que Anita havia sentado ao meu lado.

- Linda noite de Natal, não acha Luis? Hoje o mundo comemora o nascimento do Mestre Jesus. Seria tão bom que todos os dias pudessem ser assim na Terra: um eterno bem estar entre as criaturas.

- É! Você tem razão! Mas hoje, como sempre, não tenho nenhum presente para dar a ele. Disse meio triste.

- Não diga isso meu amado irmão. Você já deu ao Mestre o maior presente de todos que você poderia ofertar. Respondeu solidariamente.

- Lá vem você com suas filosofias! Dei? Qual? Perguntei intrigado.

- Você se perdoou e está pronto para perdoar Augusto! Há muito tempo que não registramos vibrações de rancor e vingança em seu coração para com ele. Isso é uma evolução, meu jovem.

- Não! Eu ainda não o perdoei! Falei desapontado. – Aliás, eu ainda não me perdoei.

- Claro que sim! Todas as vezes que você orava por ele, todas as vezes que você pedia perdão a ele mentalmente, você estava se perdoando, e também perdoando a ele. Esse exercício diário fez com que correntes de amor chegassem até Augusto. Ele, por sua vez, também retribui o pedido de perdão. Isso fez com que as teias do remorso, que são úteis no início do processo de arrependimento, não o sufocassem por mais tempo, retardando sua recuperação. Esse intercâmbio fez com que ambos se perdoassem, apesar de não se perceberem e de não se visitarem.

- Não sei como isso funciona, mas se isso realmente aconteceu, que bom! Eu sinto muito por ter feito Augusto sofrer, sabia? Hoje eu vejo o quanto eu estava errado! Se eu pudesse recomeçar, eu não faria isso mais uma vez.

- Tenha fé, meu amigo. Nunca diga que não é possível recomeçar uma nova oportunidade para o amor. Um dia, ambos saberão reiniciar, aprendendo a lição do amor.

- Eu gostaria tanto dizer a ele e a filha dele o quanto eu estou arrependido por tudo! Eu gostaria de dizer aos meus pais o quanto eu os amo e sou grato pela ajuda deles. Eu queria tanto... (comecei a chorar, interrompendo a minha fala).

- Chora, meu amigo! Chorar é bom para a alma dorida. Mas não te demores nas lágrimas, porque elas podem embaçar tua visão.

Chorei por alguns momentos, sendo acariciado por Anita. Desabafei, botei pra fora aquela sensação de saudade que até então estava presa no coração. Deixei que a brisa enxugasse minhas lágrimas e continuei a observar a noite em respeitoso silêncio. Anita levantou-se, tocou no meu obro e me convidou, com um olhar, a levantar-me. Fiquei de pé e com o coração suspenso observei o presente que Jesus reservou a mim naquela noite.

- Olha Luis, veja quem Jesus mandou para acalantar o teu coração!

- São... São... Minha voz havia embargado.

- Sim, são teus pais. Eles finalmente vêm te ver. E mais, é também...

- Augusto! Minha voz quase sumiu ao pronunciar seu nome.

Meus pais ajudavam meu antigo desafeto a caminhar, que com muita dificuldade dava seus passos... Não me contive e voltei a chorar abraçando Anita fortemente.

Fiquei frente a frente com eles, porém sem ação. Estava como anestesiado, se assim posso descrever. Os olhos do meu pai me pediam perdão; os da minha mãe ofertavam amor e os de Augusto demonstravam vergonha. Um impulso natural me vez abraçá-los com muita alegria. Todos nós choramos muito, inclusive Anita. Minha mãe, com muita docilidade na voz interrompeu os instante emotivos com saudações e palavras de amor. Sentamos e começamos a colocar em dia tanta coisa. Começamos a falar de tudo um pouco e muito de tudo que havia silenciado em nossos corações... E o tempo havia passado sem que déssemos conta. Minha mãe, cheia de vida, contou-nos a novidade que trazia:

- Trago para você, meu filho amado, boas notícias. Como você sabe, para que venhamos ser felizes, nos libertando dos erros do passado, vamos precisar recomeçar. Novas existências estão sendo planejadas para todos nós. Lembra de Ana Maria, filha de Augusto?

- Como não! Ela foi o anjo do meu socorro!

- Pois é, ela se tornou uma jovem muito bonita. Em cinco anos deverá cansar-se e terá um filho e uma filha. Eu e seu pai seremos irmãos em futura experiência física. Mais adiante, quando eu completar 25 anos irei receber Augusto como filho e seu pai, quando completar 30 anos vai casar-se e terá uma filha e um filho: você e a mãe de Ana Maria, anteriormente abandonada e já resgatada pelos companheiros da Luz. Como primos, em novos grupos familiares, você e Augusto irão crescer e aprender sobre uma nova ótica o verdadeiro amor. Nasceremos num lar espírita, aprendendo a Boa Nova de Jesus pela visão do Consolador Prometido. Você será o irmão zeloso e deverá vencer os obstáculos da vida, protegendo sua futura irmã das investidas de espíritos invigilantes. Tenha certeza que juntos iremos vencer, sob a proteção do amor infinito do Mestre Jesus, que a nenhuma de suas ovelhas desampara. Você será muito feliz! Todos nós seremos muitos felizes, mas é preciso persistir, confiar e orar a Deus.


Fiquei surpreso com as notícias, calando meus pensamentos e questionamentos por hora. Quis apenas abraçar meus pais e Augusto, desejando mostrar-lhes toda nossa Colônia. Segurei nas mãos do meu futuro primo e partimos em direção à fonte do jardim, ajudando-a a caminhar. Anita, que desejou ficar contemplando as estrelas, disse para nós uma frase que resumiu toda a minha felicidade:

- Feliz Natal meus filhos! Feliz Natal!

A noite parecia não ter fim e espero que aqueles momentos maravilhosos que eu vivi, ao reencontrar meus pais e o meu antigo algoz, possam se traduzir em novas experiências de muita alegria. Sei que as oportunidades que terei serão inúmeras e não quero desperdiçá-las, como fiz no passado. Deus já me deu tantas chances e terei mais uma. Espero contar com amigos zelosos, com companheiros de ideal espírita que ajudem este antigo e envergonhado obsessor a recomeçar a vida com muita fé e coragem. Que Deus esteja com todos nós!

Um comentário:

  1. SINTO-ME MUITO FELIZ POR TER TIDO A OPORTUNIDADE DE ACOMPANHAR A HISTÓRIA NARRADA POR ESTE ESPÍRITO QUE, COMO NÓS OUTROS, COMETEU EQUÍVOCOS, MAS QUE CONSEGUIU FAZER O "CAMINHO DE VOLTA", E HOJE, MAIS CONSCIENTES DAS RESPONSABILIDADES QUE ABRAÇAMOS, ANTERIORMENTE, PEDEM À DEUS A FORÇA E A CORAGEM PARA RECONSTRUIR NOVOS CAMINHOS. MUITA PAZ PARA NÓS TODOS, FILHOS DE DEUS!

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